O fumo dos outros
Ao Estado cabe informar, não recomendar. O paternalismo desta proposta de lei anti-tabaco fere-a com gravidade.
A proposta de lei anti-tabaco está em discussão até 6 de Julho. Antes que haja fumo branco, sublinhamos três ideias: 1) é desejável analisar, de forma separada, a intenção da lei e as medidas apresentadas; 2) o enfoque deve recair, primordialmente, nos direitos das partes envolvidas e, secundariamente, na forma eficiente de os implementar; 3) uma mudança de ‘status quo’ tem de ter em conta o contexto relevante, atendendo às assimetrias existentes. Vamos por partes.
A intenção da lei é clara: pretende-se ”salvar” fumadores e não fumadores, maximizar a esperança de vida de ambos, cumprindo o constitucional ”direito à saúde”. A frase de abertura é elucidativa: ”O consumo de tabaco é, hoje, a principal causa evitável de doença e de morte”. Mas acreditará o ministro da Saúde que a morte é evitável? E admitirá a interferência nas escolhas privadas de adultos autónomos? Ao Estado cabe informar, não recomendar. O paternalismo desta proposta de lei fere-a com gravidade.
As medidas apresentadas visam proteger os não fumadores do fumo alheio, atribuindo-lhes o direito de propriedade do ar partilhado. Proteger alguém de uma agressão exterior parece justo. Será eficiente? Ronald Coase, Nobel da Economia em 1991, mostrou que a negociação entre agentes, na presença de uma externalidade, resulta numa situação eficiente desde que os direitos de propriedade sejam claros. Essa negociação é fácil para um casal que decide a política de fumo em sua casa. Contudo, à medida que o número de agentes envolvidos aumenta, ela torna-se mais difícil, senão impossível. É aqui que entra, justificadamente, o Estado.
E, claro, onde há intervenção estatal há polémica. A maior envolve os estabelecimentos de restauração. Apenas os que tenham mais de 100m2 de área poderão ter zonas de fumadores – e até 30% da área total. A diferenciação é realista, dado que em áreas pequenas não é possível isolar o fumo. E os direitos dos proprietários? Porque não adoptar – perguntam os críticos – a solução espanhola, onde o proprietário pode escolher a política de fumo da casa? O ministro responde que isso poria em causa a eficácia da medida. Diz bem. Resta saber se a eficácia acrescida justifica a restrição de direitos.
A nosso ver, sim – mas apenas de forma excepcional e temporária. O ideal seria ter um período limitado (cinco anos?) em que vigoraria a actual proposta de lei, após o qual seria dada liberdade de escolha aos proprietários. A restrição permitiria a ”vivência” de uma solução diferente da actual – onde o enviesamento a favor dos fumadores é inegável – tendo em vista uma acrescida liberdade de escolha futura. É natural que certos liberais ”puros” se oponham a isto com unhas e dentes. Mas neste caso, para bem julgar, melhor primeiro experimentar.
A proposta de lei anti-tabaco está em discussão até 6 de Julho. Antes que haja fumo branco, sublinhamos três ideias: 1) é desejável analisar, de forma separada, a intenção da lei e as medidas apresentadas; 2) o enfoque deve recair, primordialmente, nos direitos das partes envolvidas e, secundariamente, na forma eficiente de os implementar; 3) uma mudança de ‘status quo’ tem de ter em conta o contexto relevante, atendendo às assimetrias existentes. Vamos por partes.
A intenção da lei é clara: pretende-se ”salvar” fumadores e não fumadores, maximizar a esperança de vida de ambos, cumprindo o constitucional ”direito à saúde”. A frase de abertura é elucidativa: ”O consumo de tabaco é, hoje, a principal causa evitável de doença e de morte”. Mas acreditará o ministro da Saúde que a morte é evitável? E admitirá a interferência nas escolhas privadas de adultos autónomos? Ao Estado cabe informar, não recomendar. O paternalismo desta proposta de lei fere-a com gravidade.
As medidas apresentadas visam proteger os não fumadores do fumo alheio, atribuindo-lhes o direito de propriedade do ar partilhado. Proteger alguém de uma agressão exterior parece justo. Será eficiente? Ronald Coase, Nobel da Economia em 1991, mostrou que a negociação entre agentes, na presença de uma externalidade, resulta numa situação eficiente desde que os direitos de propriedade sejam claros. Essa negociação é fácil para um casal que decide a política de fumo em sua casa. Contudo, à medida que o número de agentes envolvidos aumenta, ela torna-se mais difícil, senão impossível. É aqui que entra, justificadamente, o Estado.
E, claro, onde há intervenção estatal há polémica. A maior envolve os estabelecimentos de restauração. Apenas os que tenham mais de 100m2 de área poderão ter zonas de fumadores – e até 30% da área total. A diferenciação é realista, dado que em áreas pequenas não é possível isolar o fumo. E os direitos dos proprietários? Porque não adoptar – perguntam os críticos – a solução espanhola, onde o proprietário pode escolher a política de fumo da casa? O ministro responde que isso poria em causa a eficácia da medida. Diz bem. Resta saber se a eficácia acrescida justifica a restrição de direitos.
A nosso ver, sim – mas apenas de forma excepcional e temporária. O ideal seria ter um período limitado (cinco anos?) em que vigoraria a actual proposta de lei, após o qual seria dada liberdade de escolha aos proprietários. A restrição permitiria a ”vivência” de uma solução diferente da actual – onde o enviesamento a favor dos fumadores é inegável – tendo em vista uma acrescida liberdade de escolha futura. É natural que certos liberais ”puros” se oponham a isto com unhas e dentes. Mas neste caso, para bem julgar, melhor primeiro experimentar.
<< Home