quarta-feira, novembro 16, 2005

O poder das sondagens (I)

Serão as sondagens um reflexo da opinião pública, ou será a opinião pública um reflexo das sondagens? Provavelmente, ambas.

As sondagens são, por definição, um retrato da opinião pública no momento em que são realizadas. Mas a informação nelas contida pode levar à alteração de intenções de voto previamente declaradas. Isto faz com também a opinião pública seja um reflexo das sondagens. A interdependência entre as duas reflecte a dimensão estratégica do acto de votar. Se o debate político é crucial na definição das “preferências” dos eleitores – nomeadamente do seu candidato preferido – estas não são suficientes para prever as suas “escolhas”, por duas razões: um eleitor pode não ir às urnas; e um eleitor pode votar noutro candidato que não o seu favorito. Quer a decisão de abstenção quer a decisão de votar “útil” poderão depender das expectativas quanto às intenções de voto do restante eleitorado, as quais serão em parte baseadas na informação veiculada pelas sondagens.

Por muito “boa” que uma sondagem seja, o seu potencial impacto estratégico implica que ela não seja necessariamente confirmada nas urnas. O que explica, então, a diferença entre o retrato e o resultado? Vários factores, que devemos analisar de forma “isolada”. Por um lado, há a qualidade intrínseca dos métodos utilizados. Quanto mais fiável o retrato feito, menor a diferença esperada em relação ao resultado. Por outro, há a possibilidade de ela gerar alterações nas intenções de voto. Quanto maior o período de tempo até às eleições e a publicidade obtida, mais provável será que o resultado difira do retrato. As sondagens “à boca das urnas” – porque minimizam ambos estes efeitos – constituem, por definição, uma previsão. O último factor é a credibilidade da sondagem. Será que um retrato mais credível tem maior probabilidade de se confirmar?

Não. Quanto maior a fiabilidade do retrato – e recordo que falamos de efeitos “parciais” – maior é o incentivo à mudança na intenção de voto, porque a incerteza quanto à adequabilidade dessa mudança diminui. Daqui não resulta que a disparidade entre o resultado e a sondagem seja por si só um bom indicador da sua credibilidade. Há diversos factores a ter em conta. Apenas pretendemos sublinhar o poder estratégico que uma sondagem tem. Sendo estas questões são complexas, uma coisa é certa: quanto maior a concorrência no mercado, maior a transparência e o incentivo à excelência. E isso implica que a credibilidade duma empresa de sondagens se adquira e construa sobretudo com base nas suas qualidades intrínsecas – num ciclo virtuoso em que a aparência se vai tornando um espelho cada vez mais fidedigno da essência.