quarta-feira, novembro 02, 2005

A teoria do (des)encontro

Bastaram 11 anos para que a Teoria dos Jogos (TJ) voltasse a conquistar um Nobel: depois de Nash, Harsanyi, e Selten, a escolha recaiu sobre Thomas Schelling e Robert Aumann.
V
ale a pena desmistificar um pouco esta fascinante disciplina. A TJ é um ramo da Matemática que estuda situações estratégicas (ou “jogos”), isto é, situações onde existem vários agentes (ou “jogadores”) e a escolha óptima de cada um depende das “expectativas” relativas às escolhas dos outros. Desenvolvida pelo matemático John von Neumann e o economista Oskar Morgenstern nos anos 40, a TJ começou por debruçar-se sobre jogos clássicos como o xadrez ou o poker, e uma década mais tarde sobre questões de estratégia militar motivadas pela Guerra Fria, estendendo-se depois às ciências sociais (sobretudo à economia), e à biologia. As ambições eram semelhantes, em qualquer dos casos: i) “compreender” o jogo em questão; ii) “aconselhar” sobre a melhor estratégia a escolher; iii) “prever” o resultado desse jogo. Nash demonstrou, em 1951, que qualquer jogo tem pelo menos um “ponto de equilíbrio” (ou “solução”). Mas esse equilíbrio pode não ser único – e aqui entra um dos galardoados deste ano.

Imagine a seguinte situação. Duas pessoas amigas passeiam por Nova Iorque e perdem-se uma da outra. Ambas desejam encontrar-se, mas na impossibilidade de estabelecerem contacto (abstraia-se do telemóvel), as possibilidades de escolha são inúmeras. Qualquer local é uma possível “solução”, desde que ambas partilhem a mesma expectativa. Schelling propôs que neste tipo de jogos de “coordenação” – onde os interesses das partes estão alinhados – existe muitas vezes uma escolha que se torna relevante ou mesmo óbvia para os jogadores: o “ponto focal”. Através de inquéritos, o economista americano constatou que entre os estudantes o “ponto de encontro” favorito era a estação Grand Central, enquanto o Empire State Building recolhia o favor dos turistas.

Implicações? Duas. Por um lado, em qualquer situação de negociação onde haja alguma necessidade de consenso, uma “boa” previsão tem que atender a factores históricos, culturais, e sociais – numa palavra, atender à “tradição”. Por outro lado, a necessidade de coordenação ajuda a compreender a estabilidade de determinadas convenções sociais, como as regras de etiqueta, o sentido do trânsito, ou até a linguagem – onde todos esperam que todos tenham a expectativa que todos observem determinadas regras, sob pena de serem penalizados. No seu livro The Strategy of Conflict, o ex-professor de Harvard apresenta outros exemplos curiosos, como o da audiência que aplaude o pianista e que tem de “decidir”, a determinado momento, entre “puxar” pelo ‘encore’ ou parar de bater palmas – o que geralmente acontece de forma súbita e coordenada, evidenciando o “entendimento comum” que as pessoas têm quando partilham certos hábitos e tradições. Tida como uma das mais influentes publicações do séc. XX, é uma obra que vale a pena conhecer.